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 SE NADA MAIS SOUBERES AO MENOS
CONHECE A HISTÓRIA DA TUA TERRA


DESCORTIÇANDO

Descortiçando 


 Esta arte, é ancestral e artesanal, e os seus executantes, são pessoas experientes, desembaraçados e corajosos, para enfrentar as mais inesperadas situações, que se lhes deparam, na dura lida, da tiragem da cortiça.
Houve noutros tempos, várias "maltas" de homens de Barbacena, que durante o Verão, se encarregavam de tirar a cortiça ao sobreiro, cuja produção nacional, atinge cinquenta e quatro por cento de toda a produção, a nível mundial.
Quando o sobreiro, essa generosa e produtiva árvore lenhosa, prima chegada, da nossa bem conhecida azinheira, atinge o vinte e cinco anos de vida, está pronto a começar a produzir cortiça: porém essa casca que pela primeira vez, lhe é extraída, não tem grande valor comercial, e é chamada de cortiça virgem. A partir da primeira tiragem, contam-se nove anos, e volta-se a fazer a tiragem, aos mesmos sobreiros, naquela zona, ou ´´folha´´, como são chamadas, pelo pessoal que labuta, no montado.
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A cortiça de uma árvore, que atinja os quarenta anos de vida é chamada de"amadia" é reputada, de produto de boa qualidade. Há ainda pessoas, de outras latitudes, que pensam, que a linda e alva rolha de cortiça, que veda a garrafa, onde é guardado um bom vinho, é o fruto de uma árvore, existente na flora Portuguesa; esta engraçada noticia, foi dada em ar de gracejo, há poucos dias, num canal de televisão brasileiro.


Mas falemos então, dessa faina sazonal, que entre os fins e Maio, princípios de Junho, se inicia, nos imensos sobreirais, existentes no Alentejo, zona onde por excelência, predomina este tipo de árvore, responsável por uma fatia importante, de divisas, entradas no nosso País, derivada do produto, da exportação de cortiça, e seus derivados, para o estrangeiro.
Tirar a casca ao sobreiro, é um trabalho de equipa, que no Alentejo, principalmente na zona, onde se situa Barbacena, é efectuado por equipas de dois homens, cada, a que na gíria, se chama "parelhas"; colocados em volta do tronco do sobreiro, um dos elementos do duo formado, sobe para as cachapernas do sobreiro ou seja a parte mais elevada do tronco da árvore, utilizando um escadote rudimentar, que mais não é, que uma pernada do próprio sobreiro, em forma de forca, na qual, são escavados sulcos, em forma de degraus, que permitem ao homem que vai tirar a cortiça, subir, com maior facilidade, para pontos mais elevados. Os cortes verticais, feitos na madura casca do sobreiro, executados por ambos os tiradores, têm que coincidir entre si, nas extremidades, para assim, poderem tirar a ´´folha´´ de cortiça completa, e perfeita, que dá gosto, vê-la. Como um cirurgião, se compararmos grosseiramente, o machado especial, utilizado pelos homens da parelha, com o bisturi do clínico, também os tiradores de cortiça, não podem causar danos colaterais à pobre árvore, havendo todo o cuidado da sua parte, para não ferir o casco interior, onde corre a seiva do sobreiro.

Falando do machado, esse instrumento, aperfeiçoado para esse serviço especial, e cuja lâmina possui dois ´´gaviões´, e o cabo que termina em forma de cunha, para ajudar a descolar a cortiça do tronco, após o corte, tendo esta ferramenta, a particularidade, de só ser usada nesta actividade, devido à sua configuração, concebida exclusivamente, para a tiragem da cortiça. Depois da tiragem, é usual, e aconselhável a marcação com tinta indelével, no tronco despido do sobreiro, do último dígito do ano, em que é feita a tiragem. É este trabalho, muito duro, se tivermos em conta, o calor, o perigo das quedas, e a nada meiga espécie de formigas, vermelhas e enormes, que ao serem desalojadas do seu habitat que se situa entre a casca, que é retirada e o tronco, atacam ferozmente, o tirador com fortes dentadas, introduzindo-se no interior das vestes, e causando-lhe sofrimento.
Quando admiramos e usufruímos os vários sucedâneos e artigos feitos de cortiça, essa matéria-prima, tão nossa tão alentejana, como sejam, blocos, lambrins, isolamentos em casas, peças ultra-leves para foguetões, carteiras, malas e guarda chuvas, devemos lembrar, que tudo isso é produto do trabalho duro e arriscado, feito por homens decididos e determinados, que entre fins de Maio e princípios de Agosto, nos montados alentejanos, incluindo na área onde se situa Barbacena, enfrentando alguns escolhos, tiram a casca ao sobreiro.



Setúbal, Terça-feira, 2018


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