O RECOVEIRO, OU O HOMEM DO CORREIO
Chegava à Vila, logo, pela manhã, e deixava a mala do correio, no posto de distribuição, a funcionar na época, no edifício da extinta Casa do Povo, e seguia na sua missão de recovagem, para outras localidades, ao serviço dos C.T.T. . Chamava-se Adriano Quita, vinha da vizinha aldeia, de Santa Eulália, em cuja estação ferroviária, esperava diariamente, durante a madrugada, o comboio diligência, que trazia a mala -posta, circulando pela Linha do Leste.
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As notícias que o Sr. Quita trazia em cartas, postais ou aerogramas, nem sempre eram as melhores, mas disso, ele não era culpado.
O seu meio de transporte, era uma carroça, que no tempo chuvoso, era coberta por um tejadilho, igual ao que uma das fotos que anexo documenta. O muar que tirava o veiculo, sabia de cor o caminho, devido às inúmeras vezes, que o houvera percorrido, e assim, com o «piloto automático» a funcionar, permitia ao nosso amigo Quita, dormitar, durante a viagem.
Ao dar entrada em Barbacena, os guizos que pendiam do pescoço da animália, davam sinal ao pessoal que habitava a parte oriental da Vila, que se encaminhava para junto da Casa do Povo, na esperança de obter notícias, dos familiares que estavam longe. A garotada, que logo cedo, ia para a escola, iam caminhando ao lado da carroça, e os mais traquinas, iam perguntando ao velho recoveiro:
- Ti Quita, traz carta, para mim? A resposta do bom homem era um largo sorriso, para os petizes.
Naquele tempo, era o correio escrito, que, quase exclusivamente, assegurava a comunicação entre as pessoas. Barbacena tinha já naquela altura muitos dos seus filhos, ausentes, na diáspora, que tinha começado na década de cinquenta, por outro lado, os jovens mancebos, ali nascidos, e em idade militar, estavam às dezenas, espalhados, nas diversas parcelas do «vasto império» da época, não era portanto, motivo de admiração, que volumosos maços de missivas, chegassem pelo correio, à Vila. Da sua distribuição se encarregava o regedor e enfermeiro, José Valentim, que de lunetas, caídas sobre o nariz, ia lendo fleumáticamente, e em voz alta, os nomes dos destinatários, a quem ia entregando uma a uma as cartas que o tio Adriano trouxera.
Como conhecia toda a gente, ia o regedor, fazendo comentários, conforme fosse o volume e a configuração da carta a entregar; ao notar que uma delas vinha mais volumosa, comentava:
Esta traz recheio, tapado com papel químico; vê não percas o dinheiro !!»
Tomava por vezes, o leitor oficioso do correio, um ar mais sisudo, quando deparava com uma missiva que lhe despertava a atenção, por vir tarjada de negro; com ar mais sério soletrava: «Oh fulano: a tua carta, vem com tarja preta..!!»Todo o auditório que ansioso, ouvia a leitura do correio, suspendia o sussurrar, mas lá do fundo da sala ouvia-se alguém dizer baixinho:- «Uma carta de luto.?, seria o filho que faleceu..,?»
Era assim, que eram recebidas as noticias, há alguns anos, quando, praticamente, era apenas o correio que ligava Barbacena, ao resto do Mundo.
Carlos Catalão Panaças
Carlos Catalão Panaças
Barbacena, Quarta Feira, 07 de Novembro de 2018, ás 10H48
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