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Cada Alqueire, Um Celamim

CADA ALQUEIRE, UM CELAMIM
MOINHO DA BICHA DAS SETE CABEÇAS 015Houve em tempos idos, numa ribeira que serpenteia por entre os campos de cultivo, não muito longe de Barbacena, uma azenha (moinho de água) que produzia naquele tempo, alvas farinhas, para o povo daquela Vila, e outras terras das redondezas, muito antes, de existirem por lá, as modernas padarias, que vieram revolucionar, todo o sector da panificação naquela zona.
O Ti Fausto, era o velho moleiro, do engenho, que levava o trigo, centeio e milho produzidos aos vários seareiros barbacenenses, lá pelas sua courelas, acondicionado em sacos de sarapilheira, sobre a albarda que o Janota, carregava sobre o dorso. O Janota era um jumento, que o esforçado moleiro utilizava para o transporte do grão e da farinha, no trajecto que separava a azenha, da Vila.

De regresso, a Barbacena, traziam eles o Ti Fausto e o Janota, vários talêgos, cheios de farinha, produto de muitas horas de trabalho, naquela actividade, à qual o velho moleiro se entregava, desde menino.
A labuta da moagem, só durava, enquanto o caudal da ribeira, o permitia, o que acontecia, durante os meses, em que a chuva caía, com maior abundância; nesses meses, a velha azenha, já meio derruída, laborava dia e noite, exigindo da parte do Ti Fausto, um esforço redobrado, no seu posto de vigilante; sentado numa velha mó já carcomida, devido ao trabalho incessante, na qual, durante a noite, incidia a luz ténue de uma candeia, alimentada a azeite, Fausto, ia remexendo lentamente os bagos de trigo, que, com a cadência que os movimentos das mós determinavam, iam deslizando no ´´quelho´´, o que exigia, da parte do moleiro uma chegadela à ´´tramela´´, abrindo-a mais, para que o cereal pudesse deslizar com maior celeridade no buraco da mó de cima, e pudesse ser moído.
Mesmo durante os meses de Verão, durante os quais, a actividade da azenha, estava parada, era lá, naquele lúgubre lugar, que o moleiro Fausto, vivia, ali junto à mesma ribeira, que lhe ajudava a ganhar a vida mas que em contrapartida, já lhe roubara um filhinho de tenra idade, levado na corrente, num dia de triste memória, em que a própria azenha, parecia não ser suficientemente forte para resistir à borrasca.
Era ali, junto à ribeira, que ele morava; ali era o ´´seu mundo´´. Nos pequenos leirões, desenhados em forma de socalcos, um pequeno hortejo, que ele regava com água retida nos pégos profundos, da ribeira, retirava Fausto, tudo o que a terra adubada com o nateiro da agora seca, linha de água, lhe dava. Tal como a mó, girava, movida com força motriz, gerada por bater da água nas ´´penas´´ da enorme roda, no “cabouco” da azenha, também a vida do valente Fausto, era dura e exigente, sem domingos e feriados durante os quais, pudesse descansar.
No pino do Inverno, o caudal da ribeira, engrossava, e a ´´levada´´ que conduzia a água até à ´´caleira´´ do moinho, permitia, que enquanto houvesse água no ´´açude´´, nem o moleiro, nem o velho moinho de água, descansavam, as pesadas mós de granito, faziam o resto.
O burro pachorrento, por vezes, resmungava, quando pelas poeirentas veredas do caminho, até Barbacena, a carga dos talêgos da farinha, destinados aos donos aos donos dos cereais, que dias antes levara para o moinho, lhe faziam doer a lombada. O dono, apeado, e que o seguia à traseira, murmurava em surdina, uma lengalenga, como se o Janota, o entendesse, naquele sussurro, quase inaudível; dizia ele:
- Cada alqueire, um celamim...!! Com a ´´maquia assim tão baixa, isto não dá, nem pró pitrol..!!.
Chegados à Vila, começava a entrega porta a porta, dos talêgos da alva farinha, cujo pó branco, contrastava com a negritude das vestes do moleiro. Durante a conversa com os clientes, faltava ao moleiro discernimento, para lhes dizer, que a maquia cobrada por ele, na moagem, do trigo milho e centeio, era baixa, todavia no caminho, de regresso à azenha, como que a imputar culpas ao prestimoso e fiel Janota, ia sussurrando baixinho:
- Cada alqueire, um celamim, com a maquia assim tão baixa, isto dá nem pró pitrol..!!
      44177307_488937198281902_6097855873776877568_n    MOINHO DO JOÃO BIGODES 035     rancho folclorico da ribeira de fraguas   333  44083847_488936908281931_3339839128547098624_n
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Legenda ou prontuário:
Açude: represa construída no leito de uma linha de água.
Alqueire; medida de secos, que varia de região para região. Pode ir de 13,215, a 22,605, litros.
Celamim: medidas de secos, que é a décima sexta parte de um alqueire.
Levada: corrente de água encanada para levar a água ao moinho.
Maquia: contrapartida em géneros, que servia de paga pelo trabalho executado.
Quelho: caleira estreita, por onde o cereal escorre para o olho da mó.
Tramela: peça feita em madeira, que serve para regular o caudal do cereal para o olho da mó
Penas: asas da roda giratória, que pressionadas pelo caudal da água, fazem girar o engenho
Talêgo: saco, ou bolsa de pano, larga, que serve e para transportar secos.
Caboucos: local (cave) que estavam montados os rodízios.

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