O Fogo Fátuo
Longe vão os tempos, em que eu, ainda muito jovem, ouvia extasiado, a descrição, daqueles rapazes (eram três) que tinham que obrigatoriamente, passar junto à porta do cemitério, para ir namoriscar, a um pequeno monte, que fica fora do povoado da minha Vila aquelas, que mais tarde viriam a ser suas consortes, diziam eles - o Manuel, o Carlos e o Joaquim -, pois eram estes os seus nomes, umas vezes com o semblante carregado de surpresa, e respeito, noutras, em ar de chacota: «Aquelas chamas, vistas de noite, metem respeito...!!»
Falavam de umas misteriosas e intrigantes labaredas que se elevavam no espaço, por cima do muro do cemitério, que inclusivamente, já teriam sido vistas por outras pessoas, e como é lógico, davam azo, às mais variadas e descabidas dissertações de crendice e bruxaria, naquele tempo, em que a literacia, e a informação, eram mordomias de poucos. A minha curiosidade sobre o assunto levou-me por várias vezes, acompanhado com outros gaiatos da minha laia, a fazer, fortuitas ´´visitas´´por perto do cemitério, com o fito, de ver as tais labaredas; das ditas, nem o mais leve sinal.
Confesso, que sempre me intrigaram, aquelas descrições pormenorizadas, às quais comecei a dispensar mais atenção, quando aprendi a ler, e a perceber algo de física e química. Comecei então, a dar pouca credibilidade, às retóricas de ´´almas penadas´´ que se erguiam de noite dos túmulos, e vagueavam no campo santo, implorando missas e orações, por suas intenções, porque entendi de facto, a reacção química, operada espontaneamente, quando à vista humana, é permitido, observar a ténue e fugidia labareda, que impressiona, tanto leigos, como entendidos, quando inopinadamente, se ergue no espaço.
Anos mais tarde, em pleno cumprimento do serviço militar, lá por terras do continente africano, um dos aquartelamentos, em que fiz serviço, ficava situado, mesmo em frente de um cemitério. Numa daquelas noites tropicais, propícias, a estes fenómenos químicos, um dos homens que estava de sentinela, num dos postos fronteiro ao cemitério, entusiasmado com o que via, chamou por mim, que estava ali perto; subi a escada que dava acesso ao terraço onde estava o meu perplexo camarada, sosseguei-o, ao mesmo tempo, que eu, pela primeira vez, contemplava, tão estranho acontecimento. Tentei explicar, ao atónito sentinela, o que era tudo aquilo, servindo-me dos parcos conhecimentos, adquiridos lá nos jornais da Casa do Povo, da minha terra natal.Com a chegada do oficial de dia, um estudante de engenharia química, a quem o serviço militar, interrompeu os estudos, e que entretanto se tinha apercebido da situação, tudo nos foi mais bem explanado, e durante aquele “quarto de sentinela” ficámos a saber que, os corpos em decomposição, libertam entre outros gases, um chamado metano, que é inflamável, e que produz uma ténue e fugidia labareda, à que se chama “fogo fátuo” e que em tempos recuados, deu azo a muitos mitos, crendices e bruxarias.
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