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 SE NADA MAIS SOUBERES AO MENOS
CONHECE A HISTÓRIA DA TUA TERRA


O Rabisco

O RABISCO
43117221_483434948832127_6003127612694593536_nImpulsionado por esta vontade compulsiva, de publicar algumas histórias de vida, ocorridas, no nosso Alentejo, num período temporal, que não deixou recordações agradáveis, devido às dificuldades que eram impostas, às pessoas daquela época, não quero deixar de partilhar convosco, esta, que se passou por cá, e que se contava, quando a ocasião a isso, dava azo.-vos

Suponho eu, que a grande generalidade dos alentejanos, e não só estes, saberão o que é o rabisco.
Para aqueles que, porventura não saibam, direi, que naquele tempo, de fracas jornas, por parte de quem trabalhava, e da inexistência de pensões de reforma, ou de outros quaisquer subsídios, que lhes garantissem a subsistência, tinham que as pessoas, depois de feitas as colheitas, especialmente de azeitonas, favas, tremoços, tiragem de cortiça dos sobreiros, e outros géneros de colheitas, iam alguns idosos, e outros nem tanto, por olivais e restolhos, “catar”, alguns desses escassos produtos, que tinham passado despercebidos à vista dos primeiros colhedores, eram então apanhados pelos furtivos rabiscadores, que procuravam naquela acção - por vezes proibida -, ganhar uns cobres que iriam atenuar as dificuldades da dura vida, que lhes era imposta; a essa actividade sazonal, chamava-se rabisco.
Terminada a safra da colheita dos produtos que mencionei, os idosos que já não tinham forças para trabalhar, as crianças e os desempregados, iam então ao rabisco. Reforma e Segurança Social, naqueles tempos de escuridão e opressão, eram miragens, apenas, para uns poucos, mais esclarecidos;
depois destes considerandos todos, passamos então, á nossa história verídica, que me propus  contar-vos:- À tardinha, depois da casa arrumada, Violante, (nome ficcionado) pegou no filho mais velho, (os dois mais novos, ficaram em casa sob a guarda da mana mais velha), e lá foram, para o rabisco da azeitona.
O rancho de mulheres, que dias antes, se tinha encarregado de fazer a apanha da oliva, naquele olival, para onde Violante se dirigiu, tinha feito um bom trabalho, e pouca azeitona por lá ficara. A noite, aproximava-se a passos largos, e o imenso olival, não tardaria a ficar envolto na escuridão, e os saquitos dos nossos rabiscadores, estavam longe de ficar cheios, e a Vila, ficava longe, todavia aquele mesmo olival, não tinha ainda sido totalmente apanhado, e ali, mesmo em frente deles, haviam oliveiras carregadinhas com grossas azeitonas, e as generosas pernadas estavam baixinhas, convidativas: eram mesmo, uma tentação. A mãe disse ao filho, para lá ir num instante, e acabar de encher ali, o seu saco. Em má hora, o fez, o guarda do olival estava à coca, e aparece, mal o rapazito, começou o rabisco ilegal. Violante fica em pânico.
Se o guarda do olival, que por acaso, também era de Barbacena, fizesse queixa deles, seriam multados, como dinheiro era coisa que lá por casa, não havia, nem para mandar cantar um cego, para mais, com uma casa cheia de filhos, iria certamente, parar a uma prisão. Depois de implorar sem sucesso, ao guarda, que tolerasse o acto irreflectido do miúdo, que afinal, fora dela, no intuito do vigilante não fazer queixa à GNR, resolveu então a pobre mãe, ser mais realista, e mudar de estratégia. Começou a ralhar e a ameaçar o filho, por ter feito, o que fez. O guarda estava impassível, e alheio a tudo, em seu redor, perante a sua indiferença, a progenitora daquele pobre petiz de apenas nove anos, começou a zurzar o filho, com uma vara, que pegou do chão, a criança, já forjado, pelas agruras da dura vida, numa terra de fartura para apenas alguns, não desmentiu a mãe, e de dentes cerrados, suportou como um forte, as sevicias, que a própria mãe, lhe infligia. Foi então que o empedernido guarda, disse:
- Deixa lá o moço, e saiam daqui...para a próxima, não lhes perdoo!
Esta triste passagem ficou gravada na memória de quem a viveu,e que nos contava comovido, que a mãe, ao chegarem a casa, depois de lhe esfregar o corpo com álcool, carpindo a sua dor, o cobriu de beijos, dizendo:
- Perdoa-me meu querido filho!
Cenas destas ficaram para sempre, indelevelmente gravadas, na mente de quem as viveu, ou as ouviu contar de viva voz, lá por Barbacena, aos seus protagonistas.

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Setúbal, 05 de Outubro de 2018

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