O CAÇADOR FURTIVO, QUE SEMPRE SONEGOU, O SEU VERDADEIRO NOME
Barbacena, sempre foi, ao longo dos tempos, um lugar de gente acolhedora e hospitaleira, como é vulgar dizer-se, para aquelas pessoas, que a procuravam, para ali exercerem a sua actividade de comerciantes ambulantes, e alguns deles, acabaram por se radicarem por lá, e constituírem famílias, algumas das quais, por lá ainda persistem, em terceiro grau genealógico.
Como os habitantes da ancestral povoação, não tinham meios de locomoção, para se poderem deslocar a outras povoações, e fazerem as transacções necessárias, à sua subsistência, eram eles, esses errantes vendedores, que escalavam Barbacena, exercendo a sua actividade comercial. Aquela Vila servia de ´´porto de abrigo´ ´de vendedores de fazendas, que vindos do norte, do País, ali faziam escala, por longos períodos de tempo; pessoas de todas as paragens, e de vários ramos de comércio, como alfaiates, ourives, cordoeiros, latoeiros, amoladores de utensílios de cutelaria, contrabandistas e outros sem qualquer ocupação, apareciam na Vila; outros, de aspecto paupérrimo e andrajoso, iam esmolando, algo, que lhes permitisse manterem-se vivos, ao mesmo tempo que dedilhando uma guitarra desafinada, ou um banjo, iam cantarolando o refrão de um fado antigo, o qual relatava uma tragédia, e que constava dos ´´folhetos´´ que tentavam vender. O carpir triste da guitarra, e a letra soletrada, faziam comover, quem parava para os ouvir; confesso que nunca cheguei a saber de onde vinham, aqueles cantadores amadores, que tentavam sobreviver, relatando, como jograis, infortúnios, ocorridos algures, lá longe.
Foi talvez, neste cortejo de gente errante, que durante, aquele tempo de má memória demandou Barbacena, que deve ter aparecido por lá, o protagonista desta história, que relata uma vivência, que como tantas, confesso, me têm intrigado, ao longo dos tempos. Dele, ninguém sabia dizer, de onde viera, aquele homem de aspecto humilde, a quem o peso da idade, e algumas maldades que o destino se encarregara de lhe infligir, davam aquele ar alquebrado e andrajoso, que inspiravam a quem o via, um certo sentimento de comiseração: o seu nome de baptismo, aquele que obrigatoriamente, consta nos documentos de identificação, de qualquer cidadão, nunca ninguém o soube, certamente, pois ele sempre o sonegou, e naquele tempo, em que nesse aspecto se vivia um pouco anarquicamente, quando alguém o inquiria, sobre o seu nome verdadeiro, ele sempre o omitia. Mas... a conviver com gente, que sempre teve por hábito apodar fosse quem fosse, com anexins, também ele, recebeu o seu, e era conhecido naquele meio onde se movimentava, por «Zé Grosso».
Cortez, e respeitador, nunca foram conhecidas na Vila, quaisquer quezílias, em que o nosso amigo Zé, fosse interveniente.
Não sei se com, ou sem fundamentação, havia por lá, quem alvitrasse, que seria um ex-preso politico, oriundo do norte do País, que escolheu o interior do Alentejo, para manter o anonimato, e se auto defender do peso do ´´ferrête´´considerado por muita gente, como ultrajante, naquele tempo.
Quando bebia um copito de vinho acima da bitola do recomendável, tinha o nosso amigo, uma maior abertura na conversação, mantida connosco, mas nem mesmo, nessas escassas ocasiões, abria mão, dos seus segredos mais íntimos.
Para ganhar a vida, entregava-se à caça furtiva, sem contudo , fazer uso de qualquer espécie de armas de fogo; um simples ´´fascôto´´, (varapau) e uma considerável matilha de cães podengos, como este que a figura que anexo documenta, eram naquele tempo, em que os coelhos proliferavam lá pelas covarías dos poisios alentejanos, o arsenal suficiente, para que o ilegal caçador, enchesse a mochila, com alguns desses roedores, que trocava por algumas moedas, vendendo-os aos interessados, lá pela Vila.
De entre as muitas personagens que apareciam errantes por aquelas paragens, naqueles tempos difíceis, posso dizer, que ´´Zé Grosso´ ´foi um dos que mais me impressionou, e sobretudo me intrigou.
Setúbal, 20 de Dezembro de 2018
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